- Tais Luso de Carvalho
ATRAVÉS DOS TEMPOS...
Há milhares de anos
o homem faz arte olhando o mundo ao seu redor: paisagem, animais,
outros homens. E tira para si algo que tenha significado ou possa
transmitir uma ideia ou sentimento. Um livro de arte é como um livro
do tempo, pois nos mostra o mundo, o homem através de muitos
milheiros.
O homem das cavernas
não pintava paisagens, e na arte egípcia e romana elas pouco
apareciam. Só no renascimento as paisagens surgem na pintura. Temas
e interesses, formas e conteúdos vão se modificando ao longo do
tempo, assim como o próprio homem.
Em arte tudo é
transformação, porém um tema, o único que sempre esteve presente,
desde o período pré-histórico, é a mulher – presente e sempre
passando por transformações.
Vênus
de Willendorf - Escultura de pedra.
A
primeira mulher foi esculpida por um caçador primitivo no período pré-histórico / paleolítico superior há 40.000 anos. Atualmente se encontra no Museu de História Natural de
Viena. Tem 11 cm de altura e foi esculpida em calcário Oolítico.
Foi encontrada em 1908 na Áustria.
Deusa
das Serpentes / Creta 1800 a.C.
Com
o passar dos séculos surge a mulher de vestido longo e seios à
mostra, a figura esguia da Vênus pré-histórica – Deusa da
Serpente. Como é uma deusa, embora tenha corpo humano, é distante e
severa na postura e no olhar. Mede 29.5 cm de altura e encontra-se no
Museu Arqueológico de Heraclião / Grécia.
Retrato
da Esposa / 1350 a.C - Fig Egípcia
As
figuras egípcias são de uma elegância aristocrática. Essa mulher
é leve, magra e com roupa. O olho de frente e o rosto de perfil; o
corpo de frente, as pernas e braços de lado. Durante séculos o
Egito representou dessa maneira as figuras humanas por força de uma
tradição ligada a valores religiosos. Durante muito tempo a arte do
Egito foi esquecida da Europa. A partir do século XIX é que a arte
dos egípcios foi descoberta, passou a inspirar os artistas e
ser admirada.
Vênus
de Milo / séc II a.C. - Grecia
A
Grécia nos deixou um mundo povoado por mulheres ideais e homens
perfeitos. Na exaltação de Afrodite, a Deusa do amor e da beleza, o
artista buscou a harmonia formal: graça na postura, suavidade nos
contornos, proporção nas formas: livre, solta e bela. Por isso
encantou gerações de artistas, inspirando o Renascimento no século
XV e o Neoclassicismo no século XIX.
Flagellato
e la Baccanti / séc I - Roma
A pintura romana
chegou até nós graças a um terrível acontecimento: as cidades de
veraneio Pompéia e Herculano ficaram por muitos séculos soterradas
sob as lavas de um vulcão. Só no século XVIII é que foram
descobertas as ruínas das duas cidades que guardavam, pelas lavas
ressecadas, grandes exemplos da pintura romana. A arte de Pompéia
guardou um caráter misterioso e particular por estar ligada a uma
série de ritual que só as mulheres tinham acesso. Através dessas
obras encontradas é possível imaginar como seriam as pinturas
gregas e dos povos sob sua influência que se perderam no tempo e
não pudemos conhecer. Embora mais realista, suas figuras são mais
pesadas, as mulheres mais volumosas e menos preocupadas com os
deuses.
Imperatriz
Teodora / séc. I – Bizâncio
Os
deuses e nobres estão distantes dos homens comuns. A lição grega
aprendida pelos romanos já não interessava mais. É outra gente,
outra época em contato mais estreito com o oriente. As obras desse
período são frias, distantes, sagradas. Brilha mais o ouro no
mosaico que o olhar dos santos. No luxo das roupas, um símbolo do
poder.
Período
Românico – séc XII
São
raras as figuras femininas no período românico. A própria vida da
mulher na sociedade medieval é apagada e reclusa, pois
valores da religião cristã impregnaram todos os aspectos da vida
medieval. A igreja como
representante de Deus na terra tinha poderes ilimitados e assim
glorifica mais o Cristo do que a Virgem.
A noção do mal e do bem
orienta a arte e predomina a ideia de que a mulher representa o
pecado. Invariavelmente numa manifestação românica, ela é santa
ou pecadora e tem o corpo maltratado. Santa
ou pecadora –,
mas nunca
uma simples mulher.
Virgem
com o Menino e os anjos / séc XIV
Período Gótico
Lentamente
vão surgindo o sorriso e a 'mulher'. Aparece aqui nesse período a
riqueza das roupas, a harmonia da postura, a graça e elegância dos
contornos. Nesse período a imagem da Virgem é exaltada,
reabilitando a mulher que não é mais pecado e pode ser bela.
Essa obra é do artista italiano Cimabue. (afresco da igreja S. Francisco de Assisi - 1280)
Essa obra é do artista italiano Cimabue. (afresco da igreja S. Francisco de Assisi - 1280)
O
Nascimento de Vênus / séc XV - Renascimento
Em
imagens religiosas ou profanas a beleza da mulher é outra vez
enaltecida. Os artistas retomam a lição dos gregos. Fatores de
ordem econômica e social contribuíram para uma nova visão do
mundo. Dominando o conhecimento científico o homem se coloca no
centro do Universo. Desvinculando-se dos laços que a atavam à
religião, a arte respira um ar de liberdade e a natureza passa a ser
o foco das atenções. Procura-se a harmonia, a proporção das
formas. A pintura consegue dar às figuras uma ilusão de vida, de
volume. E as paisagens um sentido de profundidade, graças à
perspectiva. E o artista modela os rostos e os corpos femininos,
buscando outra vez uma beleza ideal, a perfeição absoluta.
Escultura
Africana / séc XX
Aqui,
já são outras as proporções e significados. É visto na arte
africana, que a obra tem de corpo magro e cabeça grande demais em
relação aos padrões Ocidentais. Mas isso pouco importava diante da
coerência e da força expressiva que impressionava na obra. Há
muito tempo a arte africana era conhecida, embora desprezada pelos
europeus. Apenas no início do séc. XX, artista como Picasso buscou
inspiração na África, reabilitando essa arte.
Barroco – O
rapto das filhas de Leucipo
séc. XVII - Rubens
Aqui
as mulheres são loiras, gordas e sensuais, aparecendo entre espirais
e arabescos. Pintura explosiva, sensual que fala ao sentido com suas
figuras tão distantes das imagens sagradas de Bizâncio. E das
formas do Românico. Os nus de Rubens são exuberantes.
Condessa
de Howe / Gainsborough - séc XVIII
Aqui
nas obras de Gainsborough, as mulheres são de uma síntese inglesa
de elegância, requinte e boas maneiras. As figuras se mostram
sóbrias, calmas e recatadas. Até na cor há sutileza com
tonalidades de outono. O artista criou uma delicada harmonia. Nada é
exaltação. Se existe alguma é no capricho das rendas. Uma graça
discreta.
Mulher
puxando as meias / Toulouse Lautrec – 1894
Lautrec
cria uma mulher mais humana do que bela; não é mais cantada a
beleza da modelo. Está muito distante dos nus de Ingrés ou da
exaltação renascentista. A mulher também não é mais um símbolo
religioso. Agora é focalizada sua intimidade. Um desenho forte,
marcante e ágil, por vezes até caricatural, define a figura. A cor
e o modelo tem menos importância. A mulher pode ser fria e triste,
mas sempre vista naquilo que tem de mais humano e sofrido.
Mulher
ao espelho / Picasso – 1932
Para
Picasso a mulher importa pouco, a realidade também. Ambas são
pretexto para uma fantasia de formas e cores. Olhando-se essa obra
se procurarmos simplesmente pela mulher, não teremos resposta. Mas
se procurarmos a pintura, encontraremos a riqueza das formas, a força
das cores, a emoção oferecida por um desenho fluído que descreve
mil espirais. É também a mulher, mas pretexto para uma festa
colorida de Picasso.
Marilyn / Pop-art – Andy Warhol
Com
várias nuances de cor, Marilyn virou coqueluche. A pop art começou
com a apropriação de objetos que, para surtir efeito precisava
multiplicar-se, nos mesmos moldes da publicidade, da imprensa e da
indústria das celebridades. Este era um dos segredos. Ainda
mulher, mas esquematizada, transformada em símbolo gráfico. A
cultura das massas, contemporânea, a partir de 1950. Embora
simplificada para facilitar a repetição e a reprodução em larga
escala, essa mulher ainda é capaz de transmitir sentimentos e
ideias. O que de fato muda no passo rápido da evolução e do
progresso é a maneira de representá-la com as mãos da arte,
universal e terna e com os olhos de cada época.
A
obra depois de criada se liberta do seu autor, do lugar onde
surgiu, e passa a viver autônoma no mundo da arte.